domingo, 23 de junho de 2013

A regra é clara, Arnaldo!



Alguém me perguntou um dia desses porque os protestos não começaram logo que o Governo Federal topou se vender pra Fifa, já somam alguns anos. Falei que os protestos se iniciaram em Sampa pelo aumento das tarifas dos transportes públicos, num movimento de esquerda que acabou se organizando por todo o Brasil, o MPL (Movimento Passe Livre). O momento só foi propício para que o caldeirão revoltoso esquentasse: aumento das passagens pelo país; discurso dos governos e prefeituras de que esse aumento tem que se dar, pois as concessionárias não têm como arcar com as despesas; milhões de pessoas migrando pelo país para assistir aos jogos em estádios tinindo de novos, se hospedando em hotéis construídos à sombra dos PDDU’s (Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano) das cidades, movimentando a economia, especialmente privada, de uma maneira enlouquecida.

Óbvio que a temática dos transportes públicos acabou tomando proporções para uma discussão além: a de um projeto real, discutido, participativo e popular de cidade – mobilidade, que é o mote maior, acesso à educação e saúde públicas de qualidade. Me atenho a essas discussões, pois o que se viu após algum tempo, pelas ruas de todo o Brasil foi uma série de bandeiras levantadas de uma maneira quase esquizofrênica (sem ofensa aos esquizofrênicos). Pautas que não tinham absolutamente nada que ver com as propostas iniciais. E, o pior, pautas direitistas, que não sei dizer se são somente direitistas ou houve um quê de alienação mesmo. Afinal de contas, pela 1ª vez em muito tempo é a classe média saindo às ruas. É a classe média aplaudindo de suas janelas, de seus carros em congestionamentos, enchendo a timeline do Facebook de notícias, charges e gritando em plenos pulmões que não dá mais.

O que não dá mais? As palavras de ordem mais citadas eram “O Gigante Acordou”, “Acorda Brasil”, dentre outras variantes como: estou na rua lutando, enquanto você está no Facebook, vendo novela etc, etc. Desculpa, mas, o que querem me dizer com isso?

Queridxs, eu sei que a maioria de nós (e me incluo nesse bolo, afinal, sou classe média) não pega ônibus, ou ao menos não sofre com os problemas de acesso à saúde e educação públicas. Depois que as manifestações se encerram, por mais que o sangue esteja quente de raiva legítima, cada um(a) vai pra sua casa, come, e vai discutir política no facebook. Queridxs, a gente, classe média, que acordou agora. O porteiro do teu prédio, as domésticas dos apartamentos onde você vive, os movimentos sem terra, sem teto, negro, feminista, LGBT etc., estão acordados há muito tempo.

Doeu muitíssimo tomar tiro de bala de borracha e ter que correr como o Usain Bolt aspirando gás lacrimogênio. É muito triste ver esse tipo de repressão fascista correndo pelo Brasil e a Globo, dentre outras, que representam a forte mídia de direita, noticiando que as manifestações são lindas e pacíficas, e apenas um pequeno grupo de arruaceiros tentou arrumar confusão com a polícia, que estava somente observando. Observando o que? Nossa passeata?, para garantir sua organização para que nós lindxs, ficássemos bem até o final?

No entanto, o que dói mais é saber que, apesar de toda a revolta que a gente sente por ter sofrido isso todos esses dias, uma reação que vai de encontro às leis da física, isso acontece todos os dias. Não conosco. Não quando estamos nas aulas, nos engarrafamentos, em casa vendo tv, no facebook, ou lendo, quando estamos até em rodinhas de discussão sobre questões políticas micro e macro, ou quando estamos até adentrando os pântanos da militância. Não acontece.

Mas acontece todo dia. Nas periferias, nas favelas. Com o jovem de pele preta que só por estar caminhando nas ruas, respirando, é um desrespeito. O que ele está fazendo ali? Suspeito, então a polícia tem que abordá-lo da maneira mais violenta possível, para relembrá-lo todos os dias que ele, e todos e todas iguais a ele estão sendo desrespeitosos por existirem simplesmente.

Acontece quando o MST, o maior movimento de luta por terra e reforma agrária da América Latina, ocupa um pedaço de terra de algum latifundiário poderoso e é oprimido pela polícia privada deste senhor, pela polícia pública e pela polícia mais atenta e opressora de todas: a mídia de direita. Todxs ali, com sua luta mais que legítima, firmada há anos, e ainda continuam sendo firmemente reprimidxs, repreendidxs e representadxs como um bando de arruaceirxs (essa expressão parece comum?).

Exemplos existem aos montes. Tanto dos que se organizam, tanto dos que não. O fato é que há uma imensa parcela de brasileirxs que está acordada há tempos; que nunca dormiu, de fato. E se resolvemos nos juntar e tomar esta luta também como nossa, temos que lembrar desses detalhes. Que, em verdade, não são detalhes.

Temos que lembrar que embora desencorajemos a polícia na maneira com que vem tratando o estudantado brasileiro esses dias, encorajamos a manter nossas ruas “limpas”, seguras e encher nossos cárceres com esses desviantes da sociedade que não têm contexto de vida, muito menos solução. Então, palmas para os policiais, e que aumentem seus salários, pois seu trabalho em manter esses marginais longe de nós, atrapalhando nossa vida e segurança, é muito perigoso.

E, sinceramente, esquecendo a polícia como um conjunto de indivíduos, e que ali há alguns que querem mesmo “descer o pau”, não repreendo a ação deles. Afinal, são trabalhadores explorados como vários outros que não puderam se organizar para estar ali lutando por seus direitos também. Além disso, sofrem uma lavagem cerebral intensa, para não se reconhecerem como iguais àqueles com os quais entram em confronto diariamente. Uma suposta hierarquia de poderes se instala, pois eles são os homens fardados e armados. Mas, quem está por trás de tudo isso, ditando quais estratégias, e, em especial, quais ordens eles devem seguir? Será que todos eles dormem em paz, em casa, após ações como estas? Será que eles têm consciência do seu papel social? Será que têm alguma vaga noção de que também são explorados e diariamente sofrem violências?

No fim das contas, após analisar tudo isso, a maior raiva que sinto é da gente. Da camada a que pertenço. Alguns de nós acordaram há algum tempo. Outros acordaram agora. Não sei quantos ainda permanecem alheios às questões mais profundas e escondidas do que vem acontecendo. Em quase 1 ano, dobrou a quantidade de usuários do sistema de transporte público em São Paulo, embora não tenha havido aumento de frota. E Geraldo Alckmin me vem com aquela cara sem expressão, em rede nacional, dizer que o aumento das taxas foi revogado, mas que os investimentos públicos terão que diminuir para compensar isto, pois as concessionárias não terão como lidar com esse não-aumento.  A Fonte Nova foi totalmente reconstruída em 2 anos, numa parceria público-privada bastante duvidosa (como várias outras acontecendo no país), enquanto o metrô de Salvador leva 20 anos em construção, tendo suas obras constantemente supervalorizadas, para que esse dinheiro entre no bolso de alguém. O STF vai gastar R$90 milhões para reformar o apartamento do seu futuro e aclamado pela direita presidente Joaquim Barbosa (dinheiro público, dinheiro nosso). Dentre tantas outras aberrações que acontecem há décadas nessa democracia enfraquecida que é o Brasil.

Nem por isso concordo que corrupção se torne crime hediondo. Primeiramente, porque não concordo com o sistema penal como um todo, e seu funcionamento. Segundo, porque aprendi que, com esses verdadeiros criminosos, é mexendo no bolso que dói mais.

Por fim, torço para que após essas manifestações, olhos sejam abertos: o problema não é o PT. O problema não é Marco Feliciano. O problema não é os Estados Unidos e o imperialismo. O problema é maior, sistêmico. E, se não houver uma revolução, que a gente comece a se organizar pra corroer por dentro.

Para que, da próxima vez, a regra não seja tão clara, Arnaldo: só quem se aproxima dos estádios é quem tem como bancar as exigências da FIFA que vêm todas juntas num só ingresso. Para que não nos curvemos, mais uma vez, ao de fora. Ao branco, rico, homem europeu. Para que o futebol deixe de ser pão e circo. E eu possa torcer pelo Brasil com o mesmo amor que torço pela Seleção Brasileira (admito).  

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Como somos contraditórios



 Como alguém que tomou uma cartela de frontal 2mg há quase um ano para dormir pra sempre não consegue mais dormir?
Como alguém que tomou uma cartela de frontal 2mg há quase um ano para "dormir pra sempre" às vezes tem muito medo de morrer?
Como alguém que tem tentado seguir disciplinadamente o yôga, parar de comer carne, se embebeda numa quarta-feira à noite, não consegue parar de fumar, de comer muito chocolate e passou a noite da quinta-feira chapado?
Como alguém que quer mudar o mundo e as pessoas não consegue mudar seus próprios hábitos auto destrutivos e hábitos que incomodam as pessoas mais próximas?
Como alguém que quer mudar o mundo sai de um grupo que trabalha há anos nesse direcionamento, com esse objetivo e não consegue mais voltar?
Como alguém se sente esgotado emocional e psicologicamente nesse grupo e com os trabalhos que são feitos e as respostas infrutíferas, sai, não volta, mas não consegue sair de um curso que não gosta, cujas notas são baixas, cuja disciplina já foi pro espaço há tempos?
Como alguém que diz amar tanto a pessoa com quem está sai pra tomar umas cervejas com alguém com quem esteve e gostou muito mesmo (mas era uma pessoa destruidora), em um dia qualquer?
Como alguém que saiu com essa pessoa que hoje é "ex-alguma coisa" ainda paquera uma outra pessoa no bar?
Como alguém que fez tudo isso, sai chapado na noite da quinta, dirigindo sem reflexos, atravessa a cidade pra ver amigos e amigas e paquera a garçonete mais bonita do lugar - mesmo estando com alguém que ama muito?
Como alguém que tem insônia, depressão e ansiedade, quer sair dessa, mas não consegue nem caminhar 30min na orla mais bonita da cidade todo dia?
Como alguém que é feminista convicta sai com essa pessoa "ex-alguma coisa destruidora", toma umas cervejas e ouve tranquilamente essa pessoa ex-alguma coisa te dissecar, dizendo que você era "mais gostosa, tinha mais perna, mais bunda" etc.?
Como alguém costuma ser a conselheira sentimental (e não se resume a relacionamentos) da maioria das amigas e de alguns amigos, mas não tira a bunda da cadeira para fazer o mesmo que aconselha a essas pessoas?
Como essa pessoa sabe que a qualquer minuto pode descer numa montanha-russa emocional, sem freios, sabe disso, mas não tenta (ou consegue) parar?

Como alguém que não dorme sem remédios há exatos 10 meses e 15 dias, odeia esses remédios, e, possivelmente, como falou uma freudiana-lacaniana, nem permite que esses remédios façam o devido efeito em seu corpo?

Pra que tanto medo de simplesmente não conseguir dormir? Pra que tanto medo de se jogar de cabeça em um relacionamento saudável dessa vez? Pra que tanto medo de fazer uma escolha de vida agora? Pra que tanto medo do futuro? A gente não sabe como vai ser o futuro. E você, há exatos 10 meses e 17 dias, quase jogou o futuro no vaso sanitário e deu descarga. Pra que tanto medo ou preguiça de fazer um esforço de sair a noite com os amigos e as amigas? Pra que tanto medo ou preguiça de se impor algumas rotinas diárias em torno de uma vida mais saudável e segui-las? Pra que tanto medo de ser paquerada e só (isso é possível. A baixa auto-estima te obriga a automaticamente querer a pessoa que te quis?)? Pra que tanto medo do tempo passando e passar? Pra que tanto medo das coisas que passam junto com o tempo e você não consegue enxergar - talvez porque não seja o momento de enxergar, talvez porque não queira, talvez porque não consiga-?

Pra que tantos questionamentos?


segunda-feira, 8 de abril de 2013

o tempo passa, o tempo voa

E eu aqui estancada.

Às vezes imagino um aquário. Limpo. Cheio de todas as coisas certinhas que os peixinhos precisam para sobreviver. Então, eles estão todos lá.
Ressalva: acho peixes e vários animais coisinhas muito lindas já postas neste mundão. Mas esses peixes, desse aquário são malignos. Cada um carrega seu peso. O peso de ser um pensamento negativo, pessimista, ilusório (embora muitas e muitas vezes não me pareça) sobre minha vida.

Então. Lá está o aquário. Lá estão os peixes. Nadando felizes e contentes nessas águas (ironicamente, já que é um aquário) profundas e caudalosas e, por muitas vezes, bastante escuras.
Cá estou eu, ocupada, trabalhando, lendo, ouvindo música, dirigindo, sentindo saudades, fome, sono.. enfim, vivendo. Até que um peixe se incomoda com essa apatia no aquário. O que está acontecendo com esse viver no modo automático? Tudo que você pensa, sente, respira tem que ser filtrado juntamente a nossas águas. E eu paro e ouço. Ouço a porcaria do peixe. E ele pede comida. E eu dou. Alimento o peixe com minhas dores e tristezas mais profundas. Se não for suficiente pra ele só, que chame outros. E eles aparecem. São vários, diversos - quanto maior a diversidade, mais divertido para eles viver nesse aquário escuro e obscuro.
E, creiam: alimentar esses (aparentemente) meros e puros peixinhos é muito fácil. E consigo facilmente transformá-los em gordos baiacus. Venenosos. E eles se reúnem. E filtram tudo o que penso, sinto e respiro. E o que volta? A água suja, impura, destilada de veneno. Para que eles se mantenham bem e bem vivos enquanto ligo meu piloto automático, até que lembre deles novamente.
E essa água parece se misturar a todos os fluídos do meu corpo e me toma completamente.

Não tem ansiolíticos, antidepressivos ou indutores de sono que consigam conter essa caixa de pandora aquática quando decidem abri-la.

Tá, ok. Eu sei que sou eu. E que pequenos peixes de aquário não tem muita força contra mim. Mas eles estão famintos e sedentos. E eu, agora, e há algum tempo, pelo menos, não tenho tido muita força para contê-los. Apenas alimentá-los. Um a um; ou todos juntos, quando resolvem fazer suas mini-rebeliões e exigir que todos me contaminem.

Às vezes penso que tenho feito o melhor possível, e eles ficam quietinhos por lá. E eu fico satisfeita por conseguir deixar ligado meu piloto automático, inclusive me dando espaço para pequenas alegrias e conquistas diárias.

Mas, no geral, tenho sido uma dona exemplar desses peixinhos de estimação.
Não queria que fosse assim. São muitos. Exigem muito alimento e muito espaço no meu ser para completarem-no com seus fluídos prejudiciais.
Não queria me apoiar nesse rótulo de "dona de peixes de estimação malignos". No entanto, é o que mais tenho feito. E consigo identificar isso em vários momentos dos dias, todos os dias. Ou até um dia inteiro.

Quero livrar-me desse aquário. Não vou vender, dar, nem trocar com ninguém. Só queria alguém que me explicasse: e aí? Como faz?

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

"...the rest is still unwritten"

Certo. Passei dias, semanas, meses querendo mudanças e mais mudanças na vida. Não sabia exatamente o que, muito menos por onde começar. E dentro de mim parecia que a ansiedade ia se acumulando como numa bolha; ia aumentando, aumentando, até estourar.
Já estourou algumas várias vezes. Às vezes consequências pequenas, médias. Uma vez ou outra, nem tanto. Uma vai ficar na história.

Enfim, nessas ruas que andei comecei a perceber que mudanças pequenas iam acontecendo, aos poucos, devagar... E a grande mudança (em mim, na rotina etc.) só percebia depois.

Exceto agora. Em questão de poucos meses mesmo: reviravolta.
Primeiro que eu estou em um relacionamento sério e mongâmico (assim dita o facebook. E a sociedade).
Segundo que saí de um trabalho. Entrei em crise. Tô a ponto de arranjar outro (dedos cruzados pra etapa final da seleção).
Terceiro que vou me mudar. Sair dessa cidade e ir pra outra. Nova faculdade. Novos projetos. Novxs amigxs (assim espero). Novas perspectivas. Novas bolhas a serem criadas e estouradas (mais uma vez, dedos cruzados para que as consequências sejam bem pequenas. No máximo, voltar a fumar).

Em pouquíssimo tempo, imagino eu, vai ser tudo muito novo. Pela primeira vez, não estou criando muitas expectativas. Por vezes e vezes não foram correspondidas (crio expectativas himalaianas) e fiquei muito mal. Mas sempre me foi natural me impor, e impor às novas situações que iria passar, grandes expectativas.
O desafio agora é controlar essa bolha de ansiedade. Deixar tudo indo, lindo, até lá. E quando chegar lá (o ponto; não exatamente lá, a outra cidade)... bom, aí é um capítulo novo (mesmo) do livro. E eu que escrevo ele todinho, né?

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A tendência é a gente seguir os caminhos que mais nos identificamos, certo? Feminismo, questão de gênero e afins são minha área.
Nada mais normal que eu me interesse mais por esses debates, esse tipo de leitura, correto?
Correto. E agora descobri que tem como aliar o que eu estudo ao que eu adoro! Engraçado como as coisas vão se conectando e a gente nem saca..

Lendo um dos meus blogs preferidos um dia desses (escreva Lola escreva), vi um post muito muito interessante sobre algo reiteradamente debatido (já já falo). Era um guest post, e a moça em questão, segue minha área (acadêmica) e ainda deixou contatos. Yeah! Claro que vou contatar!

O tema era a culpabilização das vítimas de violência sexual (inclusive tema por mim abordado na entrevista de trabalho nova). Eu não sei como ainda me impressiono com comentários absurdos relacionados a isso. Não precisa ser muito profundo quando há coisas tão óbvias: se eu tô andando na rua, saindo do ponto A e indo ao ponto B, é porque quero chegar ao ponto B. Só isso. Por que diabos eu ia querer ouvir comentários a meu respeito nesse trajeto? Por que diabos eu ia achar que os homens têm direito de comentar sobre minha aparência ou minha roupa nesse trajeto? Por que diabos alguém ia achar que passaria pela minha cabeça pegar um homem desses (e aqui me refiro a qualquer homem. Realmente não importa aparência, classe social, cor da pele etc.) já que ele me passou uma "cantada"? Por que diabos um monte de gente não consegue ver que esse cara é um imbecil machista, que quer demonstrar seu poder (claro, porque caso eu resolva tomar uma atitude sabe-se lá o que pode acontecer), ou seja, não é um tarado sem censura e que a culpa é toda dele? Não minha. A atitude dele independe de minha aparência, do que estou vestindo, onde estou andando, a que horas estou andando. Quem violenta sexualmente é o VIOLENTADOR.

Escolhi violência sexual em vez de estupro, porque vai além disso.
Primeiro, cabe um breve esclarecimento: menos de 30% dos casos de estupro são aquelas cenas que imaginamos: lugar deserto, escuro, pessoa estranha te ataca.
Na maioria dos casos é alguém próximo: um tio, um primo, namorado, marido, amigo da família, um amigo.
Outro esclarecimento, até porque mulheres muitas vezes se sentem culpadas em relação a esse raciocínio (e vou invertê-lo um pouco agora): SIM É SIM. E só é um SIM válido quando é consciente e livre. Quando o SIM é um NÃO? Quando eu digo que não. Quando eu demonstro que não. Quando eu tô bêbada e desacordada. Quando algo depende do meu sim (ex: meu emprego, minha vida).

Estupro é a prática não consensual de sexo, imposta por violência ou grave ameaça de qualquer natureza. Muito simples.

E violência sexual? Aaah! Muita gente pode se surpreender no tanto de situação que entra aqui: quando mexem comigo na rua (não, não é cantada); quando passam a mão na minha bunda (ou sei lá onde) numa festa, na rua, ou seja, quando não estou pedindo; quando me seguram pelo braço, rosto etc. para tentarem me arrancar um beijo (te dei um toco, cara, se liga!); quando vejo na televisão mulheres sendo mostradas como objetos de beleza (e só) em trajes minúsculos; quando me dão a alcunha de vadia ou similares (porque fico com vários caras OU porque recusei ficar com determinado cara. Quando se mistura isso, então...); quando estou parada em algum lugar ou andando e homens me olham com cara de que estão me despindo mentalmente ou quebram o pescoço quando passo (juro. Não é legal.); quando homens me batem - na rua ou na cama (sem que eu queira. Mesmo que eu seja uma prostituta); quando quero com camisinha e sou forçada a ir sem camisinha etc.

Revisando:
1. Cantada não é elogio. Cantada não é nem cantada: é assédio, violência.
2. 20% das mulheres já sofreu algum tipo de violência por parte de homens. Isso as que dizem.
3. A cada 5 minutos uma mulher é agredida no Brasil.
4. A culpa de QUALQUER violência nunca é da vítima, mas de quem violentou. Inclusive, no estupro, ora bolas. Se ela não disse SIM cônscia e livremente, é NÃO.
5. Mulher gosta de sexo tanto quanto homem. Se não é consensual e legal pros dois, ops!
6. Tratar mal uma mulher não te faz "mais homem, mais macho". Te faz um imbecil idiota.
7. Mulheres têm liberdade para andarem por aí, se vestindo como quiserem, se comportando como quiserem. Não estão te dando mole, te provocando, nem te dando margem para serem taxadas de nada.
8. Mulheres não são objetos a serem exibidos a seres insaciáveis; nem a serem etiquetadas como "fácil", "difícil", "vou", "não vou".


Vou parar por aqui, que isso dá pano pra manga...

sábado, 20 de outubro de 2012

50 tons insípidos

Então, resolvi sucumbir à modinha atual e ler o famoso e polêmico "50 tons de cinza".

Li em diversos blogs feministas que acompanho uma certa divergência quanto ao conteúdo feminista do livro.
Só cheguei à metade até agora. Contudo, FALA SÉRIO! Não, o livro não é feminista. Uma mulher que se propõe a ser submissa a um dominador (e são exatamente essas as denominações), mesmo sabendo o quão (não sei que adjetivo usar aqui) é ser subserviente, porque não consegue ficar longe do alto homem branco de beleza européia e rico.
Aliás, o livro carrega uma série de outros preconceitos, que, nem sei porque, ainda me choco ao me bater com eles.

Até onde cheguei, o livro pode trazer uma reflexão feminista: afinal de contas, quantas são as mulheres que se submetem sexualmente e/ou de diversas outras maneiras a homens, para satisfazê-los, não ficarem sozinhas em casa vendo tv, rodeadas de gatos, e nem se dão conta disso?
O livro está fortemente marcado pela presença do sadomasoquismo, a mistura da dor e do prazer blábláblá. Isso, pessoalmente, é o menos importante. Se os dois (ou mais) topam, e querem mesmo, beleza: o que vale é o que rola entre quatro paredes.

A grande questão é: Anastasia se submete a Grey, sabe todos os perigos, as condições; critica a ideia e se auto-critica diversas vezes por sequer pensar nisso. Mas ela escolhe esse caminho. Até onde eu li, ela escolheu porque a ideia também pareceu ser excitante para ela. Até aí, okay. No entanto, ainda na dúvida do "topa ou não topa", ela se entrega a profundos pensamentos se deve aceitar ou não, porque senão ele pode deixá-la. Oh. Que triste. Não é um relacionamento assim (mesmo que o sexo seja maravilhoso) que ela quer, mas topa porque não vai tê-lo. Ela topa O QUE ELE QUER, senão vai ficar sozinha. Oi? Isso aí não é feminismo. Isso aí que é a submissão.

O livro é ruim, sem sal, sem açúcar, sem nada gostoso. Não me deixou um pingo excitada (enojada e enraivecida algumas vezes). A única reflexão que me trouxe é a já mencionada: a submissão sexual que Anastasia se permite é uma analogia (pra mim. Sei lá o que se passou pela cabeça da autora) para uma série de submissões que as mulheres se impõem, ou se deixam impor, (sem questionar ou contestar), em seus diversos tipos de relacionamento - seja no sexo ou não.

50 tons bem insípidos mesmo.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Início, fim e meio

Alguém me disse algumas milhares de vezes: "Escreva! Você tem talento, não deixe isso se perder!" (Tá. Esse alguém foi minha mãe. E elogio de mãe, pra mim, não conta.)

Enfim, mas dentre momentos de desespero, de me sentir perdida, de pensar: Caralho, meu! Eu não tenho nenhum talento?, eu escrevi um post no facebook, em homenagem a uma amiga que se mudou. E, apesar do texto ter sido pensado e escrito para ela, milhões de pessoas (umas 30 e pouco, o que é muito pra mim) curtiram. Porque eu escrevi sobre uma angústia que paira sobre nossas (jovens, ou nem tão jovens assim) cabeças há um tempo: o se tornar adulto e todas as suas consequências. Boas e nefastas - como essa: dizer tchau, adeus, até logo. As pessoas têm a liberdade de sair pelo mundo (consequência positiva), mas vão deixando seus rastros e vão ficando com pegadas de outras pessoas (consequência negativa), enquanto o mundo vai girando.

Nada contra fazer seus planos, girar o mundo enquanto o mundo gira. Mas, putz!, cansei de dizer 'até logo''s travestidos de 'adeus''s - sendo que vem um bem bonito aí pela frente.

Já girei um bocadinho pelo mundo, e faço a cada dia mais planos pra que isso continue acontecendo. E já dei muitos adeus(es) por aí.
E aí, caiu a ficha. Nem consigo mais pegar uma porcaria de folha de papel em branco pra escrever sobre o que eu sinto, incluindo aí "não ter talentos". E alguém me disse (e não foi minha mãe): "Texto fodão esse o seu!" E outra pessoa: "Você escreve muito bem e lindamente. Continue"

Porque não?

Já tive muitos inícios e meios e fins.
Resolvi começar outro. Mesmo que ninguém leia isso aqui. Agora vou ter que encarar minhas folhas de papel em branco.